O Programa Especial de Realojamento prometia terminar com os bairros de barracas, realojando quem lá vivia em habitações dignas. A promessa ainda está por cumprir. O que é feito dessas famílias? Onde vivem as que foram retiradas dos bairros?
Segundo dados dos Censos, existiam 20.460 barracas no país, em 1991. A larga maioria situava-se na região da Grande Lisboa (12.212), do Grande Porto (1.311) e na Península de Setúbal (1.101), e as restantes estavam espalhadas pelo país. O alojamento precário foi elevado a problema nacional e o governo de então pôs em marcha um programa que prometia resolvê-lo: “nunca tão grandes incentivos foram preparados para os municípios enfrentarem, com a colaboração do governo, o problema das barracas”, dizia o então primeiro-ministro Cavaco Silva. E reforçava que “programas como este não se resolvem com discursos nem com palavras fáceis”. Assim foi: em 1993, criou-se o Programa Especial de Realojamento (PER), que pretendia erradicar todos os bairros de barracas das áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto.
O plano era ambicioso. Hoje, passados mais de 25 anos da sua apresentação, continua por cumprir. Das 48.416 famílias sinalizadas, 11.126 ficaram por realojar, o que significa que apenas 72% do programa foi executado. Com atrasos constantes na implementação, as famílias e os bairros foram crescendo, o que criou mais problemas. Segundo dados do Levantamento Nacional das Necessidades de Realojamento Habitacional, de fevereiro de 2018, apenas 20 dos 27 municípios concluíram o programa. Bairros como o 6 de Maio, na Amadora, seguem em luta por alternativas dignas de habitação.
O mesmo Levantamento Nacional identificou 25.762 casos de agregados familiares a viver em situações de precariedade habitacional com necessidade de realojamento (vários ativistas e investigadores dizem que a realidade é bem mais grave que a que o número revela). Para isso, o governo criou o programa 1º Direito, com o objetivo de resolver o problema da carência habitacional do país. Em julho, o primeiro-ministro António Costa garantiu: “Quando, daqui a seis anos, comemorarmos os 50 anos do 25 de Abril, poderemos dizer que eliminámos todas as situações de carência habitacional e, 50 anos depois de Abril, garantimos a todos os portugueses o direito a uma habitação adequada”. Ou seja, mais de um quarto de século depois da apresentação do PER, por Cavaco Silva, é agora António Costa que promete resolver o problema.
O que aconteceu às famílias realojadas? Para onde foram viver? Que tipo de casas lhes foram oferecidas? Que condições têm os bairros para onde os municípios as encaminharam? Que famílias estão ainda por realojar? Quem vive hoje nos terrenos onde os bairros de barracas existiam? Quem detém os terrenos e quem ganhou à custa da retirada destas pessoas?
Nesta série Fumaça, vamos perceber como correram os processos de demolição, realojamento e construção de bairros pertencentes ao PER e ao Estado português, desde 1993.
Fumaça
Olá!
Olá!
Está a fazer três anos que viemos para a redação a pensar que, talvez, afinal, não éramos loucos. Tínhamos financiado a nossa campanha de crowdfunding e garantido que a redação recebia 21 768 euros para investigar três temas: Mulheres esquecidas, sobre mulheres que foram esquecidas e marginalizadas pela história; Bairros PERdidos, sobre o Programa Especial de Realojamento (PER) e os bairros de barracas; e Presos e Prisões, sobre o funcionamento dos estabelecimentos prisionais em Portugal.
Gostávamos de ter dar uma breve atualização e dizer-te o que estamos a fazer para cada uma destas investigações, que, como em todas as séries do Fumaça, levam e levarão alguns anos da conceção à publicação.
Presos e prisões
https://fumaca.pt/prisoes/
Há 12 mil pessoas presas em Portugal. Todos os anos, cinco mil saem, e cinco mil entram. Nesta investigação, procuramos o objetivo dessa reclusão, expomos as violências que encerra, e questionamos a sua eficácia.
465 pessoas doaram 9 543 euros.
Da campanha de crowdfunding, esta foi a investigação que começámos primeiro. Começámos este trabalho há cerca de dois anos e já temos mais de 110 horas de gravação. Neste momento, é nisto que estamos a trabalhar:
- A transcrever as entrevistas que já fizemos a pessoas reclusas, suas amigas e familiares, para perceber que perguntas levamos para dentro dos estabelecimentos prisionais;
- A entrevistar técnicos superiores de reeducação, guardas prisionais e profissionais de saúde que trabalham para a Direção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais, no interior e exterior das prisões;
- A ler sobre a história do sistema prisional português, e a preparar entrevistas que a explorem;
- A consultar os processos judiciais que acompanham casos específicos de possíveis abusos que temos seguido nos últimos anos.
- Temos publicado várias das entrevistas que gravámos para preparar esta série, ainda sem previsão de lançamento.
Mulheres esquecidas
https://fumaca.pt/mulheres-esquecidas/
Ao longo de centenas de anos, mulheres ficaram à margem dos relatos históricos. As suas vidas, mais ou menos públicas, ficaram por contar. O género está intrinsecamente ligado do ato de ser esquecida ou marginalizada pela História. Quando termina este vazio? A que mulheres não se permitiu o devido (re)conhecimento público? Quem são e o que fizeram?
300 pessoas doaram 6 034 euros.
Arrancamos com esta investigação no ano passado, mas foi apenas nos últimos meses que lhe dedicámos mais tempo. Em vez do formato habitual de série, decidimos contar várias histórias que vamos publicando ao longo do tempo. Neste momento, é nisto que andamos a trabalhar:
- Estamos a trabalhar em parceria com a Cassandra, uma estrutura de criação artística, para uma reportagem sobre trabalho doméstico (já gravámos duas das três entrevistas que planeamos);
- Estamos a ler “O tempo das criadas”, de Inês Brasão, e “Revolting Prostitutes – The Fight for Sex Workers’ Rights”, de Juno Mac e Molly Smith;
- Estamos a acompanhar o coletivo Manas, em Lisboa, e a trabalhar numa reportagem sobre a comunidade que mantêm;
- Começamos as transcrições das horas que já gravámos.
- Previsão de lançamento da primeira peça: 2024
O trabalho sobre o PER e bairros sociais ainda não começou. Temos uma equipa pequena e recursos reduzidos, de momento focados na série sobre policiamento que desde 2018 preparamos com a revista digital Divergente (https://fumaca.pt/as-policias-em-portugal/). Enquanto não a lançarmos, idealmente no próximo ano, não nos conseguiremos debruçar sobre os Bairros PERdidos, para que 237 pessoas doaram 6 191 euros. Até lá, podemos prometer-te que não nos esquecemos.
Obrigada pelo apoio e por continuares desse lado.
Um abraço,
Equipa Fumaça
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Fumaça
Conseguimos, e agora?
Olá,
Ontem terminamos a nossa campanha de crowdfunding para três investigações: Bairros PERdidos; Presos e Prisôes - Com que Direito?; e Mulheres Esquecidas - Um ar que se lhes deu. Todas atingiram os objetivos de financiamento, num total de 21 748€ angariados.
Durante os próximos tempos vamos trabalhar estes três temas, e prometemos ir deixando atualizações regulares sobre o estado das séries. Mas a melhor forma de saberem o que é que andamos a fazer depois desta campanha é subscrever a nossa newsletter: https://fumaca.pt/subscrever/.
Pode ser que encontrem outros trabalhos interessantes e decidam entrar na Comunidade Fumaça e tornar-se também contribuidores mensais (https://fumaca.pt/contribuir/).
Um abraço, e até já.
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